A implementação da reforma tributária do consumo no Brasil marca uma reestruturação significativa do sistema atual, especialmente com a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Entre os mecanismos inovadores propostos, destaca-se o chamado split payment, um modelo que promete transformar a forma como os tributos são recolhidos e administrados.
O que é o split payment?
O split payment, ou "pagamento dividido", consiste na retenção automática dos tributos diretamente no momento da liquidação financeira de uma transação comercial. Ou seja, quando um boleto ou fatura é pago, o valor correspondente ao IBS e à CBS é imediatamente desviado para os cofres públicos, antes mesmo que o fornecedor receba o montante líquido da operação.
Esse modelo já é adotado em outros países e está sendo adaptado à realidade brasileira com o objetivo de aprimorar o controle fiscal, mitigar a sonegação e modernizar o processo de arrecadação.
Como funcionará na prática?
Ao contrário do sistema vigente, onde a empresa recebe o valor integral da venda e posteriormente recolhe os tributos devidos, o novo modelo transfere essa responsabilidade para as instituições financeiras e os prestadores de serviços de pagamento. Esses agentes passarão a operar como intermediários entre o contribuinte e o fisco.
A execução ocorrerá em três etapas principais:
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Identificação da operação por meio da nota fiscal eletrônica;
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Análise automática dos tributos incidentes, com verificação de possíveis créditos a serem compensados;
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Recolhimento do saldo devedor, com a transferência do valor restante ao fornecedor.
O procedimento será embasado nos dados da nota fiscal, o que exigirá integração entre sistemas, padronização de formatos e desenvolvimento de tecnologia de ponta para garantir segurança e eficiência.
Modalidades previstas
A reforma contempla diferentes modalidades de split payment:
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Modalidade inteligente: consulta em tempo real aos sistemas do Comitê Gestor e da Receita Federal para calcular e reter o valor exato do tributo.
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Modalidade simplificada: destinada a adquirentes não regulares, aplica uma alíquota fixa predefinida com base em critérios padronizados, a ser ajustada posteriormente.
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Modalidade manual: voltada a operações específicas ou setores com particularidades operacionais, como compras em dinheiro ou cheque.
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Recolhimento proporcional em operações parceladas: o tributo será retido à medida em que cada parcela for paga, embora ainda haja discussões sobre o momento de consolidação da obrigação tributária.
Pontos de atenção e desafios
Apesar do potencial positivo, o modelo também impõe desafios significativos ao setor produtivo. Entre os principais pontos de preocupação estão:
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Impacto no fluxo de caixa: a antecipação do recolhimento pode comprometer a liquidez das empresas;
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Acúmulo de créditos tributários: situações de excesso de crédito sem possibilidade imediata de compensação podem gerar saldos represados e pedidos de restituição;
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Custo de adaptação tecnológica: será necessário reestruturar processos internos e investir em sistemas para adequar-se às novas exigências;
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Risco operacional: a dependência de sistemas inteligentes e automatizados demanda confiabilidade e estabilidade para evitar falhas no recolhimento.
Etapas de desenvolvimento e regulamentação
A estruturação do split payment está a cargo do Ministério da Fazenda, em articulação com o Banco Central, a Receita Federal e os fiscos estaduais e municipais. A regulamentação está prevista para ocorrer em fases, com ampla participação do setor financeiro e do Comitê Gestor do IBS.
A Câmara dos Deputados e o Senado Federal discutem ainda a regulamentação de três modalidades distintas de aplicação do mecanismo: automático, manual e simplificado – sendo este último pensado para operações de varejo com menor complexidade fiscal.
Considerações finais
O split payment é uma das peças centrais do novo modelo de arrecadação tributária e representa uma inflexão importante na forma como tributos sobre o consumo serão administrados no Brasil. Embora sua promessa de maior eficiência e transparência seja bem recebida pelos entes públicos, o sucesso da medida dependerá de uma regulamentação clara, da cooperação entre os setores envolvidos e da capacidade de adaptação das empresas.
A transição para esse novo modelo exigirá planejamento, investimentos e atenção redobrada. Empresas que se anteciparem e estruturarem seus processos estarão em melhor posição para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades dessa nova era tributária.
